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Clickjus: Abandono afetivo em face dos ascendentes, uma violação ao dever de cuidado

A responsabilização civil, nesse contexto, relacionar-se-ia com a violação ao dever moral e jurídico de cuidado.

Clickjus: Abandono afetivo em face dos ascendentes, uma violação ao dever de cuidado

O abandono afetivo inverso, no sentido de alteração do binômio da relação paterno-filial, segundo a doutrina, pode ser definido enquanto inadimplemento dos deveres de cuidado e afeto dos descendentes com os ascendentes, ou seja, a inércia no cuidado que se funda nos valores jurídicos da solidariedade familiar e segurança afetiva, abrangendo as esferas patrimonial, emocional, moral, psíquica e física que tratam inclusive da convivência, amparo, respeito e assistência, concretizando, por conseguinte, postura negligente e omissão injustificada em relação a essas obrigações.

Este dever de cuidado, associado ao abandono imaterial, está inscrito no texto constitucional, na segunda parte do artigo 229 “os filhos maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade”, assim como no arcabouço axiológico presente no artigo 230 que determina o dever de amparo aos idosos pela família, a fim de assegurar-lhes dignidade e bem-estar, como expressões do direito à vida, os quais também se refletem no artigo 3º do Estatuto do Idoso, com o objetivo de garantir os direitos fundamentais às pessoas idosas, de tal maneira que na mesma norma jurídica, especialmente no artigo 98 criminaliza-se o comportamento de abandono em hospitais, casas de saúde, entidades de longa permanência e a negativa em prover as necessidades básicas desses sujeitos, com pena de detenção de seis meses a três anos e multa.

Na perspectiva normativa, importante sublinhar o tipo penal que diz respeito ao abandono material (art. 244, CP), isto é, deixar, sem justa causa, de prover subsistência de ascendente inválido ou maior de 60 anos (idoso), não lhe proporcionando os recursos necessários, com pena de detenção de um a quatro anos e multa, de uma a dez vezes o maior salário mínimo vigente no país.

A responsabilização civil, nesse contexto, relacionar-se-ia com a violação ao dever moral e jurídico de cuidado, consubstanciada na omissão voluntária por parte dos descendentes no prisma de promover concretude à dignidade da pessoa humana, não se referindo a uma imposição do afeto, mas da compensação e ensinamento acerca dos valores que são afrontados em circunstâncias que caracterizam o abandono afetivo inverso.

A decisão da Ministra Nancy Andrighi no Recurso Especial 1.159.242/SP é paradigmática no concernente à temática do abandono afetivo na qual declarou que “inexistem restrições legais à aplicação das regras concernentes à responsabilidade civil e o consequente dever de indenizar/compensar no Direito de Família”, acrescentando que esse não fazer atinge bem juridicamente tutelado (dever de cuidado), o que importa em vulneração da imposição legal, “exsurgindo, daí, a possibilidade de se pleitear compensação por danos morais por abandono psicológico”.

Finalmente, sustenta-se que esta temática além de pertinente e atual, reflete situações e aspectos da vida em sociedade que precisam ser continuamente debatidos para que os direitos fundamentais da pessoa idosa sejam concretizados, enfatizando ainda que o Estatuto do Idoso no artigo 45 exemplifica as medidas protetivas que podem ser efetivas quando, por exemplo, os direitos dos idosos forem ameaçados ou violados por falta, omissão ou abuso da família. 

Wilson Sales Belchior – Graduado em direito pela UNIFOR, especialista em Processo Civil pela UECE, MBA em Gestão Empresarial e mestrando em Direito e Gestão de Conflitos na UNIFOR. Também possui curso de curta duração em resolução de conflitos na Columbia Law School, nos Estados Unidos. Na mesma instituição participou de série de pesquisa avançada. Palestrante, professor universitário em cursos de pós-graduação em diferentes estados e autor de diversos artigos e livros, publicados em revistas, jornais, portais de notícias e editoras de circulação nacional. Conselheiro Federal da OAB (2013-2015). Vice-presidente da Comissão Nacional de Advocacia Corporativa do Conselho Federal da OAB (2013-2015). Membro da Comissão Nacional de Sociedade de Advogados do Conselho Federal da OAB (2010-2012). Membro da Coordenação de Inteligência Artificial do CFOAB (2018). Atualmente é Conselheiro Federal eleito para o triênio 2019-2021.

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