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ClickJus: Inteligência Artificial, princípios e recomendações da OCDE (Parte II)

Na literatura especializada já se encontram investigações sobre os desdobramentos internacionais dessas diretrizes.

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Prosseguindo na análise da “Recommendation of the Council on Artificial Intelligence”, documento elaborado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) para a estruturação de padrões internacionais direcionados à Inteligência Artificial (IA), abordam-se os princípios e recomendações que constituem as diretrizes da organização para promover confiança pública e benefícios a todas as partes interessadas.

(1) Crescimento inclusivo, desenvolvimento sustentável e bem-estar: benefícios que devem ser proporcionados às pessoas humanas e ao planeta. O documento menciona rol exemplificativo, incluindo as finalidades de aumentar as capacidades humanas, promover criatividade e inclusão de populações sub-representadas, reduzir desigualdades (econômicas, sociais e de gênero) e proteger o meio-ambiente.

(2) Valores centrados no ser humano e equidade: obrigação de respeito aos direitos fundamentais e humanos, valores democráticos, Estado de Direito e diversidade. 

Pretende-se garantir a supervisão e/ou intervenção humana, sempre que necessário, em algum momento da disponibilização subsequente de produtos e serviços (validação simultânea ou posterior, desligamento durante o funcionamento e restrição das capacidades operacionais em determinadas circunstâncias).

Importa sublinhar que em documentos dessa natureza os direitos que se buscam proteger se relacionam a riscos potenciais das novas tecnologias. Nesse caso, o rol de direitos que o documento explicita liga-se a três principais riscos que podem ser causados pelos sistemas de IA: violação da vida privada (privacidade e proteção de dados), vieses que importem em discriminações proibidas (não discriminação, equidade, diversidade e justiça) e redução dos postos de trabalho (direitos trabalhistas internacionalmente reconhecidos).

(3) Transparência e explicabilidade: a transparência relaciona-se ao fornecimento de informações significativas que permitam aos usuários entenderem quando estão tratando com sistemas de IA e não com seres humanos. A explicabilidade destina-se a mitigar o risco da opacidade, isto é, a dificuldade de auditar e/ou conferir o processo de tomada de decisão, previsão ou recomendação realizado por sistemas de IA relacionando-se, igualmente, a eventuais obstáculos de compreensão, na perspectiva de usuários humanos. 

Uma vez atendido esse princípio, é possível as autoridades verificar diante de caso concreto a legislação e o regime de responsabilidade aplicáveis aos resultados provocados por decisões envolvendo IA. Aos usuários adversamente afetados permite-se o questionamento judicial dos resultados gerados pelos sistemas de IA em informações claras e fáceis.

(4) Robustez, segurança e proteção: exigência de gestão e avaliação dos riscos dos sistemas de IA durante toda a sua vida útil, de forma que funcionem segundo o planejamento prévio, sem externar riscos de segurança irracionais. Assim, se torna viável a investigação do conjunto de dados utilizados no treinamento e funcionamento, de processos e decisões tomadas pela IA.

(5) “Accountability”: os atores engajados no desenvolvimento de sistemas de IA devem ser responsabilizados de acordo com, no mínimo, esses princípios.

Esse é um desafio para os Estados nacionais, no que toca a atribuição de regime de responsabilidade para atores, aplicações e sistemas tão diversificados entre si. Mais uma vez, essa discussão precisa orientar-se pela cautela inerente a análise do quadro legal e regulamentar existente atualmente diante dos novos desafios e pelo reconhecimento da rapidez com que essa tecnologia evolui, a qual não consegue ser acompanhada pela produção normativa ou atividade regulatória.

As recomendações estruturam-se em torno de objetivos estratégicos que podem ser adotados pelos atores estatais, quais sejam: (1) facilitar o investimento público  e privado, de modo a estimular a inovação em questões técnicas desafiadoras e conjuntos de dados representativos; (2) organizar mecanismos de compartilhamento seguro, justo, legal e ético de dados e conhecimento, com infraestrutura e tecnologias digitais acessíveis; (3) apoiar a transição ágil do estágio de P&D para implementação e operação de sistemas de IA revisando, quando apropriado, normas, regulamentos e mecanismos para checagem de conformidade; (4) capacitar as pessoas para o uso e a interação com sistemas de IA organizando programas de treinamento profissional; (5) governos e partes interessadas devem cooperar ativamente para promover princípios, compartilhamento de conhecimento e desenvolvimento de padrões.

Na literatura especializada já se encontram investigações sobre os desdobramentos internacionais dessas diretrizes. À medida que as iniciativas para legislar e regular os sistemas de IA vão surgindo ao redor do mundo será possível observar com mais assertividade os reflexos do documento organizado pela OCDE, formado pelo conteúdo mínimo a fim de assegurar que se desenvolvam sistemas de IA confiáveis.

Wilson Sales Belchior – Graduado em Direito, especialista em Processo Civil e Energia Elétrica, MBA em Gestão Empresarial, Mestre em Direito e Gestão de Conflitos, Doutorando em Direito Constitucional. Advogado, palestrante, professor universitário em cursos de pós-graduação em diferentes estados e autor de diversos artigos e livros, publicados em revistas, jornais, portais de notícias e editoras de circulação nacional. Atualmente é Conselheiro Federal da OAB eleito para o triênio 2019-2021 e Presidente da Comissão Nacional de Direito Bancário.

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