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ClickJus: STF entende ser constitucional o compartilhamento de dados sem ordem judicial

O caso concreto diz respeito ao recurso ajuizado pelo MPF em face de decisão do TRF da 3ª Região que anulou ação na qual ocorreu compartilhamento de dados.

ClickJus: STF entende ser constitucional o compartilhamento de dados sem ordem judicial

O Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 1.055.941, por maioria dos votos, fixou tese, na sistemática da repercussão geral, quanto à validade do compartilhamento de dados bancários e fiscais do contribuinte, obtidos pela Receita Federal e Unidade de Inteligência Financeira (antigo COAF) com o Ministério Público e autoridades policiais, para fins criminais, sem a necessidade de prévia ordem judicial, entendendo que:

1 – É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita Federal do Brasil, que define o lançamento do tributo, com os órgãos de persecução penal, para fins criminais, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial, devendo ser resguardado o sigilo das informações em procedimentos formalmente instaurados e sujeitos a posterior controle jurisdicional.

2 – O compartilhamento pela UIF e pela Receita Federal do Brasil, referente ao item anterior, deve ser feito unicamente por meio de comunicações formais, com garantia de sigilo, certificação do destinatário e estabelecimento de instrumentos efetivos de apuração e correção de eventuais desvios.

O caso concreto diz respeito ao recurso ajuizado pelo MPF em face de decisão do TRF da 3ª Região que anulou ação na qual ocorreu compartilhamento de dados, 600 folhas com informações de extratos bancários e imposto de renda de réus e terceiros, sem autorização judicial prévia.

O julgamento foi iniciado em 20 de novembro com o voto do Ministro Relator Presidente do STF Dias Toffoli, o qual reconheceu a constitucionalidade do compartilhamento das informações, com a ressalva de que as Representações Fiscais para Fins Penais da Receita Federal não poderiam ser instruídas com documentos considerados sensíveis, relativos à privacidade (íntegra de extratos bancários ou declaração de imposto de renda), para os quais se faria necessária a autorização judicial e o MPF ao receber a representação deveria instaurar Procedimento de Investigação Criminal comunicando necessariamente ao juízo competente para supervisão judicial. 

Todavia, na sessão de 28 de novembro, o Ministro Presidente Toffoli retificou seu voto para dar provimento integral ao recurso, ressalvando sua posição pessoal, mas adotando o entendimento da maioria, admitindo que a Receita compartilhe a íntegra do procedimento administrativo fiscal, sem autorização judicial.

Na sessão de 21 de novembro, o Ministro Alexandre de Moraes posicionou-se pela constitucionalidade do compartilhamento das informações pela Receita e UIF, declarando que a proteção e inviolabilidade de dados, intimidade e vida privada não podem servir, de acordo com o ministro, como “escudos protetivos para práticas ilícitas”, divergindo do Ministro Relator, ao entender ser constitucional o compartilhamento da íntegra do procedimento fiscalizatório, incluindo extratos bancários e declarações de imposto de renda.

Na sessão de 27 de novembro, os Ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux votaram reputando constitucional a transferência de dados sem ordem judicial prévia. O julgamento continuou na sessão de 28 de novembro com os votos da Ministra Cármen Lúcia e dos Ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Celso de Mello.

O Ministro Fachin entendeu que se é lícita a coleta de informações pelo Fisco, igualmente lícito é que esses dados sejam compartilhados com órgãos de persecução criminal, acrescentando que o compartilhamento referente aos montantes globais pode ser feito, independente de estabelecido procedimento fiscal, ao passo que uma vez iniciada a investigação, a Receita poderia compartilhar informações irrestritamente.

O Ministro Barroso compreendeu que o caso não é hipótese de quebra de sigilo, mas transferência de sigilo, que deve ser mantido pelo órgão que recebe as informações, considerando que se os dados foram obtidos licitamente não deve existir problema para seu compartilhamento. 

A Ministra Rosa Weber sustentou que é consectário do Estado de Direito a exigência de que a descoberta de condutas potencialmente criminosas pelos agentes públicos reverbere no acionamento dos órgãos da administração para investigação e apuração de possíveis delitos, não se justificando a imposição de condicionantes ao compartilhamento desse conteúdo.

O Ministro Fux se posicionou no sentido de que não é adequado que a Receita Federal ou a UIF ajuízem ação unicamente para enviar dados aos órgãos de persecução criminal, tendo em vista que a intermediação do Judiciário nesse tipo de comunicação violaria, segundo o Ministro, o princípio acusatório e a titularidade exclusiva do titular da ação.

A Ministra Cármen Lúcia votou pela constitucionalidade do compartilhamento, compreendendo que não há ilegalidade em tal ato, retomando a jurisprudência do STF no que tange à licitude do acesso pela Receita aos dados bancários dos contribuintes sem ordem judicial, assim, consoante a Ministra, se o acesso é lícito, a remessa desses dados também é legítima.

O Ministro Lewandowski entendeu pela validade da transferência das informações, sem a necessidade de prévia autorização judicial, destacando que não se trata de compartilhamento indiscriminado, mas de repasse de provas associadas à sonegação fiscal para fins de promoção de responsabilidade criminal.

O Ministro Gilmar Mendes compreendeu que as declarações de Imposto de Renda e extratos estão abrangidos pela constitucionalidade do compartilhamento, desde que sejam estritamente necessários para composição de indícios de materialidade nas infrações apuradas, bem como  no que se refere à UIF, visto que os dados do órgãos são peças de inteligência financeira e não constituem elementos probatórios.

O Ministro Marco Aurélio votou pelo desprovimento do recurso, sustentando que não seria possível o compartilhamento de dados sem autorização judicial, criticando ainda a extrapolação das normas, em virtude de o objeto do Recurso Extraordinário ser, de acordo com o Ministro, referente exclusivamente ao Fisco.

O Ministro Celso de Mello votou para manter a decisão do TRF da 3ª Região, mencionando que o STJ já havia julgado no sentido de não ser lícito à Receita Federal compartilhar dados obtidos com instituições financeiras, acrescentando que não são absolutos os poderes dos agentes estatais, ao enfatizar a inviolabilidade dos dados individuais e a importância da autorização judicial para evitar indevidas interferências que podem se tornar, segundo o Ministro, “verdadeira devassa” na vida dos contribuintes.

Wilson Sales Belchior – Advogado e graduado em direito pela UNIFOR, especialista em Processo Civil pela UECE, MBA em Gestão Empresarial e mestre em Direito e Gestão de Conflitos na UNIFOR. Também possui curso de curta duração em resolução de conflitos na Columbia Law School, nos Estados Unidos. Na mesma instituição participou de série de pesquisa avançada. Palestrante, professor universitário em cursos de pós-graduação em diferentes estados e autor de diversos artigos e livros, publicados em revistas, jornais, portais de notícias e editoras de circulação nacional. Conselheiro Federal da OAB (2013-2015). Vice-presidente da Comissão Nacional de Advocacia Corporativa do Conselho Federal da OAB (2013-2015). Membro da Comissão Nacional de Sociedade de Advogados do Conselho Federal da OAB (2010-2012). Membro da Coordenação de Inteligência Artificial do CFOAB (2018). Atualmente é Conselheiro Federal eleito para o triênio 2019-2021 e Presidente da Comissão Nacional de Direito Bancário.

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