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A nostalgia saudosista e a palidez millennial de La La Land – Cantando Estações

Eu adoro jazz. Adoro musicais. Deve ser por isso que eu odiei tanto La La Land - Cantando Estações. Poxa, o protagonista é um pianista usando polainas! Como diabos conseguiram fazer isso dar errado?

A nostalgia saudosista e a palidez millennial de La La Land - Cantando Estações

La La Land - Cantando Estações ou a história de um cara branco e presunçoso explicando porque jazz é tudo de bom por duas horas pra uma moça que veio pra Hollywood ser atriz em cenários vazios e sem cor. E tem umas musiquinhas. — Foto:Divulgação

La La Land – Cantando Estações, o aclamado (pelo Globo de Ouro) musical de Damien Chazelle, diretor de Whiplash, não é essas coisas todas, não. Falta vigor, falta emoção, falta mensagem, falta mostrar a que veio num filme que só foi prejudicado pelas altas expectativas levantadas pela sua imerecida premiação.

Pode ser que seja pela minha falta de repertório, mas os dois únicos musicais que consigo me lembrar de ter assistido, fora todos os da Disney, tenham sido Os Miseráveis e Moulin Rouge. Então a impressão que eu tenho de musicais é a de uma atuação mágica, teatral, extraordinária, exagerada e intensa. De emoções à flor da pele, dor, lágrimas e riso. Uma vivacidade quase cartunesca.

Conflito.

Moulin Rouge tem dor e lágrimas, cativante em toda a sua essência burlesca e teatralidade exagerada. Os Miseráveis, longo como foi, passou bem rápido da primeira vez que vi e me deixou desidratado de tão emocionante. Claro, fica difícil comparar com uma performance como a da Anne Hathaway cantando com a cabeça raspada sobre os tigres que vem à noite, mas La La Land não tenta entregar nada sequer minimamente parecido em intensidade.

La La Land é mais um desses filmes da nossa geração, contidos, pálidos, cinzentos, repletos de azul bebê e bege pastel que já vimos em Ela (2013) e 500 Dias Com Ela (2009). Não é mágico, não é glorioso, não é incrível, não provoca riso nem lágrimas: é brando, suave, animadinho e morno. Isso num filme sobre jazz é quase um insulto.

Suas cores frias nos sugerem uma época mais antiga, uma Los Angeles vazia dos anos 30 ou 40, mas não se deixe enganar pelas polainas de Sebastian: smartphones, veículos e aparelhos eletrônicos deixam bem claro que o filme se passa num hoje fantasioso.

Desde o começo do filme até o fim, Sebastian (Ryan Gosling) e Mia (Emma Stone) estão prontos pra conseguir o que eles sempre quiseram. 

Seb é apresentado como um pianista extremamente talentoso e saudosista dos tempos áureos do jazz. E como todo saudosista de tempos que não viveu, ele não faz outra coisa no filme senão tentar convencer sobre como esses tempos eram bons; mas sempre falando. Mostrar, que é o que realmente conta, não.

Mia é uma barista num café starbucks genérico que passa suas folgas indo em audições pra tentar um papel pra atuar. Ela é frustrada com o fato de suas interpretações serem totalmente ignoradas enquanto os produtores e avaliadores olham seus smartphones ou pedem sanduíches. Se eu fosse um avaliador e uma moça chorasse parecendo o Gollum do Andy Serkis, eu também iria ficar olhando meu WhatsApp. Mas enfim.

Sebastian quer abrir um clube de jazz e preservar o que ele considera ser o jazz certo. Mia quer escrever e atuar seus próprios papéis. A maioria das histórias de Hollywood é sobre pessoas que só precisam sofrer, suar, sangrar e se esforçar por um lugar ao sol. Mas a gente não sente essa luta. Não em La La Land.

E isso reflete muito a época que vivemos e o público pra qual esse filme foi feito. Uma época onde manter o foco no que quer que seja é um trabalho tão demasiadamente hercúleo que chega a parecer uma vitória se expressar claramente.

Sim, o Sebastian só tem essa cara. O filme todo.

A temática principal do filme (a ideia de correr atrás dos sonhos e trazer arte a um mundo cinzento onde nos conformamos em trabalhar no que dá apenas pra pagar as contas) é uma das minhas favoritas, mas o filme peca justamente no ponto essencial desse tema fascinante, que é mostrar a dificuldade. Falta sofrimento em La La Land – Cantando Estações.

Tá tudo pronto e entregue de bandeja. Sem obstáculos convincentes, a única dificuldade pra eles atingirem a carreira desejada parece o tipo  de mal-entendido estúpido que se resolve com 2 minutos de conversa no mundo real.

Tem uma fala no trailer em que o Keith, um músico que mistura música eletrônica ao seu estilo, (e como Sebastian odeia isso, torna o rapaz a coisa mais parecida com um antagonista que a história tem) diz: “Você diz que quer salvar o jazz, mas como você salva o jazz se ninguém está ouvindo? Esses caras eram revolucionários. Como você vai ser revolucionário se é tão tradicionalista? Jazz é sobre o futuro!”

Taí um baita questionamento! Vamos ver que resposta Sebastian daria pra isso! Qual é a resposta dele? Spoiler: uma que deixará claro que ele não passa de um rapaz caprichoso e saudosista de uma época que não viveu – exatamente como o público do filme.

O. filme. todo.

Ao ridicularizar o tipo de nostalgia por uma época fantasiosa justamente quando o filme depende totalmente dela pra entreter, o filme entra num cinzento “mundo real” de conformação e submissão. Se fosse um musical sobre um cara que ama o jazz, essa seria a cena que ele levanta e canta uma música sobre como o jazz nunca será datado e limitado, numa resposta bem dada e divertida. Mas não. O cara baixa a cabeça e assina na linha pontilhada.

Falando nisso, La La Land – Cantando Estações tem poucas músicas, e nenhuma memorável. Você vai ver várias críticas elogiando os 10 primeiros minutos da película, sua “imensa genialidade”. Isso é porque os 10 primeiros minutos te convencem que o filme é um musical, mas daí em diante ele esquece de sê-lo, e passa a ser um filme onde uma ou outra música é cantada, dentro de uma narrativa “não-musical”. A diferença é gritante, irritante. Cenas que poderiam ter sido divertidas e cativantes se fossem cantadas (como a da insistência do Seb em improvisar ao invés de seguir a playlist indicada pelo seu patrão mandão, um inteiramente desperdiçado J. K. Simmons) são apenas cenas normais, enfadonhas como trechos preto e branco num filme que devia ter sido todo colorido.

E esses contrastes, ao invés de fazer as cenas musicais parecerem mais intensas, saem pela culatra: com a nossa suspensão de descrença (necessária pra curtir um musical) totalmente arruinada pelo excesso de cenas “no mundo real” no miolo do filme, as cenas musicais chegam cada vez mais díspares, discrepantes, dissonantes. Num filme sobre música, falta harmonia.

Pior ainda é o final: correndo atrás do prejuízo depois de dezenas de cenas friorentas e plásticas feito uma samambaia de escritório, o filme tenta de uma única tacada inserir todo o conflito, toda a musicalidade, todo o romance e todo o surrealismo que se espera de um musical: e falha.

Falha, porque estamos cansados. A cena final, que deveria ser um clímax épico, é um anticlímax em todos os sentidos: visualmente, narrativamente, musicalmente. Uma das coisas mais importantes numa narrativa (em qualquer mídia) é a regra do “não fale, mostre”. 

Talvez eu esteja tão desapontado por causa de expectativas elevadas (porque sete Globos de Ouro com certeza deixaram minhas expectativas astronômicas). Bom, fica a dica: não se deixar levar pela hype.

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