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Anvisa adia decisão sobre aval a plantio de Cannabis para uso medicinal

A decisão também ocorreu em meio a pressões do governo, que tem se posicionado contra a proposta.

Anvisa adia decisão sobre aval a plantio de Cannabis para uso medicinal

Apresentada em junho, a proposta prevê que o aval ao plantio possa ser dado para empresas interessadas em pesquisa e produção de medicamentos, mediante cumprimento de regras de segurança. — Foto:Reprodução

BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – Após quase três horas de discussões, a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) adiou nesta terça-feira (15) a votação sobre a proposta que libera o plantio de Cannabis no país para pesquisa e produção de medicamentos.

A medida ocorreu após pedido de vista de dois diretores: Fernando Mendes e Antônio Barra Torres. O primeiro pediu mais prazo para análise da proposta que prevê normas para registro de medicamentos à base de Cannabis.

Já Barra, que assumiu o cargo em agosto após ser indicado pelo governo Jair Bolsonaro, pediu vistas da proposta que liberaria o cultivo da planta por empresas.

Em geral, o prazo de vista é de duas sessões. Diretores, porém, podem solicitar mais prazo, mediante justificativa. Na prática, não há data para o debate ser retomado.

O adiamento ocorreu após mais de três horas de debates nesta terça-feira (15). A decisão também ocorreu em meio a pressões do governo, que tem se posicionado contra a proposta.

Atualmente, o plantio de maconha é proibido no país. Desde 2006, no entanto, a lei 11.343 prevê a possibilidade de que a União autorize o plantio “para fins medicinais e científicos em local e prazo predeterminados e mediante fiscalização” – daí a tentativa da Anvisa em regular o tema.

Apresentada em junho, a proposta prevê que o aval ao plantio possa ser dado para empresas interessadas em pesquisa e produção de medicamentos, mediante cumprimento de regras de segurança.

Entre elas, está o cultivo em “casas de vegetação” fechadas e protegidas por sistema de dupla porta, com monitoramento por câmeras e acesso condicionado à biometria. O aval será condicionado à análise de antecedentes criminais de responsáveis técnicos.
A medida prevê ainda apresentação de planos de segurança para evitar desvios, inspeções periódicas e transporte de matéria-prima por meio de empresas especializadas. O cultivo doméstico permanece vetado.

Além das normas para plantio, a agência também avalia novas normas para acelerar a liberação de medicamentos à base da Cannabis.

A ideia é que haja possibilidade de aceitar estudos ainda em andamento, desde que já apresentem resultados positivos em tratamentos e haja um plano de gerenciamento de riscos.

Em outra frente, a agência propõe facilitar a entrada no mercado de produtos específicos à base da planta. Neste caso, empresas poderão notificar a agência para oferta de produtos, os quais não serão avaliados pela agência, mas monitorados no mercado.

A responsabilidade pela qualidade do produtos, assim, seria da empresa, usuário e do médico prescritor.

Segundo a Anvisa, essa nova norma deve ser aplicada para produtos industrializados que contenham predominantemente o canabidiol, componente da Cannabis conhecido por ter efeitos terapêuticos e por não “dar barato”. Será permitida, no entanto, que haja até 0,2% de THC, canabinóide que possui esse efeito. A composição é semelhante aos produtos hoje alvo da maioria dos pedidos de importação em outros países.

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A proposta estabelece ainda que esses produtos tenham embalagem específica nas farmácias e façam parte de um sistema que permite a rastreabilidade da venda, da mesma forma que já ocorre para produtos controlados. A publicidade é vetada.

Desde 2015, a agência avalia pedidos de autorização para importação excepcional desses produtos por pacientes.

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Nos últimos quatro anos, ao menos 7.785 pacientes tiveram esses pedidos autorizados. As doenças mais citadas nos laudos médicos são epilepsia, autismo, dor crônica, doença de Parkinson e transtornos ansiosos.

O custo alto, no entanto, faz com que muitos recorram ao cultivo clandestino ou a ações judiciais contra o SUS, o que levou a agência a apresentar a proposta.

Em voto de cerca de uma hora, o diretor-presidente da agência, William Dib, defendeu as medidas.

Emocionado, disse que há uma omissão do poder público para regulamentação da Cannabis para fins medicinais, o que, segundo ele, “afronta o direito constitucional à saúde”.

Em seguida, apontou o aumento no número de pedidos de importação e ações judiciais como justificativa para a proposta.

“Sem insumo não há pesquisa, e sem pesquisa não há avanço. Os números favorecem compreender que há uma demanda real de prescrição sobre esses produtos. Esse pleito não pode ser entendido como uma excepcionalidade”, disse.

O debate, porém, foi interrompido antes que outros diretores pudessem votar.
Parlamentares pressionam e familiares rebatem A audiência também foi marcada por embates entre parlamentares e apelos de representantes de pacientes.

Horas antes da reunião, uma faixa com a frase “Parem de perseguir familiares que cultivam Cannabis para produção de medicamentos” foi estendida em frente a sede da Anvisa, em Brasília.

A medida foi interpretada dentro da agência como um pedido das famílias para revisão das propostas, restritas à participação de empresas. E, também, como um apelo ao governo, que tem se declarado contra dar aval ao plantio no país e a favor apenas da importação de matéria-prima, como óleos a base de canabidiol.

O embate foi reforçado nesta terça pela participação, na reunião, de parlamentares favoráveis e contrários à proposta da Anvisa.

“Tenho ouvido tantas coisas, como que o uso de cannabis medicinal pode levar ao tráfico de drogas. Isso não é verdade”, disse a senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP), que é tetraplégica e usa óleo à base de Cannabis.  “Se alguém disser que a maconha é a pior coisa que existe essa pessoa deve ter parado nos anos 1960.”

“A senadora contemporizou. Maconha é uma droga pesadíssima. É a porta de entrada de outras drogas”, disse o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), contrário à medida.
Para ele, há um “lobby poderosíssimo” para liberação da maconha no país por meio do aval ao uso medicinal.

Familiares de pacientes rebateram. “Pergunto para os senhores: quanto vale a vida da minha filha? Qual o preço da vida dela?”, disse Norberto Fischer, pai de Anny, portadora de uma síndrome rara que gera convulsões.

Em 2014, a história dela ficou conhecida por meio do documentário Ilegal, o que impulsionou os debates sobre o uso medicinal da Cannabis. “Negar que as famílias tenham acesso a tratamento com canabinoides é ir contra o motivo da existência da Anvisa.”

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