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Especialistas criticam argumento para prisão de Jefferson, apesar de crimes

Segundo Moraes, o político divulgou vídeos e mensagens com o "nítido objetivo de tumultuar, dificultar, frustrar ou impedir o processo eleitoral".

Especialistas criticam argumento para prisão de Jefferson, apesar de crimes

Moraes assinou o mandado contra o presidente do PTB sem a manifestação da PGR, que não cumpriu o prazo de 24 horas para se posicionar. — Foto:Reprodução

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) — Há pelo menos dois níveis de discussão em relação à prisão do presidente do PTB, Roberto Jefferson, determinada pelo ministro Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal).

A primeira delas é se caberia ou não prisão preventiva. Entre os especialistas ouvidos pela reportagem, não houve consenso. Parte considera que a medida até seria possível frente aos indícios, mas criticam a fundamentação. Há quem considere que a argumentação do ministro foi suficiente.

Outra questão é se teria havido cometimento de crimes por parte de Jefferson. Neste ponto, é consenso entre os especialistas que diversas das falas de Jefferson ultrapassam os limites da liberdade de expressão, adentrando a esfera criminal. Entretanto, ressaltam que nem todas as falas apontadas configurariam crime e que essa análise mais detalhada deve ser feita no decurso da investigação.

Também houve críticas ao posicionamento da PGR (Procuradoria-Geral da República), que apontou que a prisão seria uma forma de censura prévia. No entanto, eles dizem não ter ficado claro qual o posicionamento do órgão quanto a se estariam ou não configurados crimes nas falas elencadas na decisão de Moraes.

Parte dos especialistas ressalta ainda que, diferentemente da prisão do deputado Daniel Silveira (PSL-RJ), cujo pedido partiu do STF, no caso de Jefferson a solicitação foi feita pela Polícia Federal.

O líder do PTB e aliado do presidente Jair Bolsonaro foi preso na última sexta-feira (13) no âmbito da investigação sobre suposta organização criminosa digital voltada a atacar as instituições a fim de abalar a democracia.

Em maio do ano passado, o ex-deputado já tinha sido alvo de busca e apreensão e de bloqueio de suas redes sociais.

Segundo Moraes, o político divulgou vídeos e mensagens com o “nítido objetivo de tumultuar, dificultar, frustrar ou impedir o processo eleitoral”.

Moraes assinou o mandado contra o presidente do PTB sem a manifestação da PGR, que não cumpriu o prazo de 24 horas para se posicionar.

O ministro do STF listou indícios de mais de dez crimes. Na decisão de 38 páginas, a maior parte não se refere à argumentação jurídica, mas à transcrição de diversas manifestações de Jefferson em entrevistas nos últimos meses e que foram reunidas pela PF.

O professor de teoria e história do direito da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) Diego Nunes argumenta que parte dos crimes apontados referentes à Lei de Segurança Nacional já estariam em tese configurados apenas pelo discurso. Ele considera que, como o inquérito está em sigilo, é provável que haja mais elementos que embasem indícios de risco de violência.

“Os artigos 22 e 23 são crimes cometidos verbalmente. São condutas que extrapolem aquilo que se entende como liberdade de expressão.”

Como exemplo de possível crime, ele destaca as falas defendendo a invasão do Senado. “Me parece que em tese estaria incitando a subversão da ordem política e social.”

Em entrevistas, Jefferson fez declarações como: “Eu penso que nós temos que agir agora. Concentrar as pressões populares contra o Senado e, se preciso, invadir o Senado e colocar para fora da CPI a pescoção. Porque moleque a gente trata a pescoção”.

“Nós, o povo, fazermos uma pressão no dia da CPI, invadirmos aquele troço e colocar pra fora a pescoção os senadores que compõem a comissão de inquérito. (…) E jogar todo mundo dentro daquele lago em frente ao Congresso Nacional, pra ver se eles fazem um batismo em água e Deus entra no coração daqueles satanazes.”

As principais críticas à decisão por parte de advogados e especialistas em direito se devem à fundamentação da prisão. Mesmo entre aqueles que concordam com a medida há quem faça esta ressalva.

Anamaria Prates Barroso, advogada criminal e doutoranda em direito constitucional, considera que, em tese, a prisão preventiva poderia ter sido feita com base na reiteração da conduta criminosa.

“A reiteração é quando você diz eu estou demonstrando que a pessoa continua praticando novamente o crime por diversas vezes”, explica. Ela considera, entretanto, que Moraes não utilizou essa repetição como fundamento. “Ele chegou a falar em reiteração diversas vezes, mas este não foi o fundamento da prisão.”

Para Prates, o fundamento utilizado está no trecho em que Moraes cita a necessidade de garantia à ordem pública e os fortes indícios de materialidade e autoria dos crimes.

Ela aponta que, apesar de ainda se estar na fase inicial do inquérito em que são apontadas as probabilidades, o discurso extrapola a liberdade de expressão. 

“As falas do Roberto Jefferson são falas mesmo de incitação, a gente consegue ver isso. Liberdade de expressão não é manifestação ou discurso de ódio, nem homofóbico ou incitação à violência.”

Já Thomaz Pereira, que é professor da FGV Direito Rio, faz uma análise diferente sobre a fundamentação da prisão. Ele considera que a reiteração da conduta foi um dos elementos utilizados por Moraes. Aliado a isso, ele aponta que, além da conduta reiterada, haveria risco de violência.

“Tem dois tipos de crimes, se fosse simplesmente os crimes contra a honra, talvez seria simplesmente a questão de reiteração de conduta, mas como está tudo junto dentro de um pacote que inclui tipos da Lei de Segurança Nacional, que falam sobre processos violentos de derrubada, relacionados a subversão da ordem política, haveria um elemento de violência possível.”

Comparativamente a ações anteriores, como a prisão de Daniel Silveira, o professor Diego Nunes avalia como diferencial que a prisão de Jefferson não foi simplesmente o STF agindo em própria defesa.

“Foi uma ação da Polícia Federal, que é o órgão competente para fazer este tipo de investigação. O Ministério Público foi notificado e não falou dentro do prazo, o que é algo muito estranho”, afirma.

A PGR não divulgou seu parecer, mas disse em nota que “a prisão representaria uma censura prévia”.

A professora de direito penal da FGV Raquel Scalcon discorda da posição da PGR.

“Ele [Jefferson] não está usando do seu direito fundamental de liberdade de expressão, o que ele faz está à margem desse direito, não é protegido por esse direito. Então eu não posso dizer que a prisão viola a liberdade de expressão, porque isso pressupõe que tudo que era dito era totalmente lícito.”

Ela aponta, contudo, que ao longo da investigação é provável que parte dos crimes apontados sejam descartados. “Acho que houve sim crimes, tenho dúvidas se foram todos aqueles. Acho que há algum excesso.”

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