“Neste momento, temos que encarar que existe um indício forte de relação entre o zika e a síndrome de Guillain-Barré, mas para ter certeza absoluta precisamos de mais elementos e avaliar com mais profundidade os pacientes que desenvolveram a síndrome”, diz o médico Marcondes Cavalcante França Junior, coordenador do Departamento Científico de Neurogenética da Academia Brasileira de Neurologia (ABNeuro).
O zika vírus foi identificado pela primeira vez no Brasil em abril e sua relação com a microcefalia já foi confirmada pelo Ministério da Saúde.
O G1 contatou as secretarias de saúde de 24 estados brasileiros, além do Distrito Federal. Com exceção dos seis estados já citados, os outros não constataram aumento significativo de Guillain-Barré ou não tinham dados disponíveis. A doença não é de notificação compulsória, ou seja, não é obrigatória a comunicação de casos individuais às autoridades sanitárias.
Saiba quais são os sintomas e tratamentos da síndrome de Guillain-Barré e entenda o que já se sabe sobre a possivel relação com o zika vírus.
Quais são os sintomas da síndrome de Guillain-Barré?
A síndrome de Guillain-Barré – que pode afetar pessoas de qualquer idade, especialmente adultos mais velhos – começa a se manifestar por formigamento nos pés e pernas. A sensação tem caráter ascendente, ou seja, vai subindo para os joelhos, coxas, mãos e braços.
O formigamento e a alteração da sensibilidade dos membros vêm acompanhado de fraqueza nos músculos e paralisia. Os sintomas podem atingir os músculos da face e da respiração, o que faz com que o paciente precise ser tratado em unidades de terapia intensiva (UTI).
Quais são as causas da doença?
A síndrome de Guillain-Barré ocorre, na maioria das vezes, algumas semanas após uma infecção por vírus ou bactéria. O que ocorre é que o organismo do paciente desenvolve uma reação imunológica para combater a infecção e destruir os vírus ou bactérias. Mas existem estruturas nos vírus e bactérias que são muito parecidas com a bainha de mielina, estrutura que reveste as células nervosas.
Neste momento, temos que encarar que existe um indício forte de relação entre o zika e a síndrome de Guillain-Barré, mas para ter certeza absoluta precisamos de mais elementos”Marcondes Cavalcante França Junior, neurologista
“O sistema de defesa, de uma hora para outra, passa a ter como alvo a capa que reveste o nervo, chamada mielina, que é um isolante elétrico que faz com que o impulso nervoso seja conduzido mais rápido. A bainha de mielina é acometida e o impulso elétrico passa a não ser mais conduzido”, explica o médico Tarso Adoni, membro da ABNeuro e neurologista do Hospital Sírio-Libanês. É por isso que a síndrome pode ser considerada uma doença autoimune.
Algumas infecções que já foram associadas ao desenvolvimento de Guillain-Barré são as infecções por citomegalovírus, vírus da gripe, da dengue, da hepatite, além de bactérias como a Campylobacter jejuni.
Há evidências de que o aumento de casos tenha relação com o zika vírus?
Considerando o aumento expressivo do número de casos de Guillain-Barré em regiões onde também se constatou a presença do zika vírus, especialistas consideram que existem fortes indícios de correlação. Até o momento, porém, o Ministério da Saúde não confirma a existência desse vínculo. A pasta está analisando a situação e deve divulgar resultados em breve.
Instituições como o Hospital da Restauração, no Recife (PE), que já atendeu um número excepcional de casos de Guillain-Barré este ano, também desenvolvem estudos para confirmar a possível correlação.
O médico Érico Arruda, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), pondera que é mais difícil confirmar a correlação entre o zika e a síndrome de Guillain-Barré do que foi em relação à microcefalia. “Na maioria dos casos, a síndrome de Guillain-Barré ocorre após a conclusão da viremia. O vírus vai embora e depois vem o Guillain-Barré. Por isso seria mais difícil encontrar o vírus nesses pacientes.”
Zika vírus tem como sintoma erupções na pele e coceiras: especialistas estudam relação do zika com a síndrome de Guillain-Barré (Foto: Reprodução / TV Globo)
Como é o tratamento?
A doença pode regredir de maneira espontânea, mas existem dois tratamentos que aceleram a recuperação. Um deles é a plasmaférese, procedimento que lembra a hemodiálise, em que o sangue é filtrado para remover os anticorpos que estão lesando os nervos do paciente. O tratamento exige uma estrutura hospitalar complexa e uma equipe com experiência em hemoterapia.
O outro é a injeção de imunoglobulina humana, que faz com que os anticorpos deixem de atacar os próprios nervos. O tratamento de um único paciente com essa estratégia pode custar entre R$ 30 e 40 mil. Segundo o neurologista Marcondes Cavalcante França Junior, da ABNeuro, os dois tratamentos estão disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS), porém nem todos os hospitais têm a estrutura necessária para aplicá-los.
Além disso, é importante que o paciente fique internado durante a doença porque, caso a paralisia afete os músculos respiratórios, ele precisa ser submetido à ventilação mecânica. Mesmo pacientes com sintomas mais leves devem ser internados, pois a doença pode evoluir rapidamente.
Há risco de o paciente ficar com sequelas?
A síndrome de Guillain-Barré é considerada uma doença de prognóstico favorável pelos médicos. Em 85% dos casos, há uma recuperação praticamente completa que pode levar de dois a quatro meses. Em 15% dos casos, pode haver sequelas, desde as mais leves, como fraqueza nos pés ou dormência, até as mais significativas, em que os pacientes podem perder a capacidade de andar.