RIO — Um aplicativo instalado no celular do médico e vereador Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho (sem partido), mostra que ele se movimentou entre 1h41 e 1h52 de 8 de março, data da morte do menino Henry Borel, dando um total de 81 passos em 61 metros percorridos.
Os dados da ferramenta contradizem o depoimento prestado pelo parlamentar e a namorada, Monique Medeiros da Costa e Silva, mãe da criança. Dez dias depois do óbito, o parlamentar disse ao delegado Henrique Damasceno, titular da 16ª DP (Barra da Tijuca), durante o inquérito que apurava a morte de Henry, que o casal assistia, desde 1h, a uma série na televisão no quarto de hóspedes, quando pegou no sono.
A professora diz ter acordado Jairinho às 3h30 para mudarem de cômodo, quando encontrou o menino caído no chão, com mãos e pés gelados e olhos revirados.
Recuperadas pela Polícia Civil, as informações do aparelho constam nas investigações do caso e foram obtidas com exclusividade pelo GLOBO.
O aplicativo, que gerencia consultas médicas, prontuários e até atendimentos por telemedicina, além de aspectos da vida diária, como atividades físicas, informa também que Jairinho só voltou a se movimentar entre 4h06 e 4h14 daquela madrugada.
Aos policiais, ele disse que, ao colocar a mão em Henry e perceber que ele “estava realmente com a temperatura bem abaixo do normal”, “com a boca aberta” e “respirando mal”, ajudou a enrolar o menino com uma manta e “imediatamente” foram para o Hospital Barra D’Or.
Imagens de câmeras de segurança do Condomínio Majestic, no Cidade Jardim, onde a família morava, que foram periciadas por profissionais do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE), mostram que o casal saiu com o menino nos braços de Monique às 4h09 em um dos elevadores.
Um laudo, assinado ainda por peritos do Instituto Médico Legal (IML), aponta que ele estava morto ali, o que é corroborado pelas médicas que o atenderam na emergência pediátrica da unidade de saúde. O exame de necropsia feito horas depois apresentou hemorragia interna e laceração hepática, provocada por ação contundente, além de equimoses, hematomas, edemas e contusões.
Também em depoimento na 16ª DP, uma ex-namorada de Jairinho disse ter falado com o vereador, através de mensagens de celular, na madrugada de 8 de março. Debora Mello Saraiva contou que, à 1h47, ele escreveu: “Pelo amor de Deus!”, em resposta ao texto enviado por ela, às 15h47, dizendo: “Tô cansada de você”. A estudante disse ser “rotina” os dois conversarem em horários como 2h, 3h, 4h e até 5h.
Ao longo da última semana, Monique, em 50 páginas escritas a mão, afirma que vivia um relacionamento de agressões, humilhações e ciúmes por parte do parlamentar. Ela admitiu que a narrativa apresentada durante seu depoimento fora uma “versão inventada” sobre a morte de Henry.
A estratégia teria sido, segundo ela, a condição dada pelo advogado André França Barreto para defender o casal no inquérito que os investiga pelo crime. Em nota, o advogado afirmou que a defesa “sempre pautou a sua atuação pela ética e pela técnica, jamais alterando a narrativa apresentada pelo casal, desde o início e de forma única”.
Nesta terça-feira (4), Monique e Jairinho foram indiciados por homicídio duplamente qualificado, com emprego de tortura e impossibilidade de defesa do menino.
O vereador vai responder ainda duas vezes pelo crime de tortura contra o menino e a professora uma vez pela na modalidade omissiva do mesmo delito. A conversão da prisão temporária do casal em preventiva também foi pedida.
O advogado Braz Santana, que defende o parlamentar, informou que só irá se pronunciar sobre o caso quando uma eventual denúncia for oferecida pelo Ministério Público. O caso está nas mãos do promotor Marcos Kac.