Cotidiano

Ambição de pais sul-coreanos é ter filhos altos

Com agulhas de acupuntura movendo-se nos cantos da sua boca como se fossem bigodes de gato, Moon Bo-in, de cinco anos, geme de dor. Mas o médico, usando um jale

Com agulhas de acupuntura movendo-se nos cantos da sua boca como se fossem bigodes de gato, Moon Bo-in, de cinco anos, geme de dor. Mas o médico, usando um jaleco amarelo estampado com personagens de desenho animado, insere mais agulhas nos pulsos e no couro cabeludo da criança.

"Tudo bem, querida", diz a mãe dela, Seo Hye-kyong. "Isso vai lhe ajudar a ser bonita e alta. O tratamento vai fazer de você uma Cinderela".

Uma convicção crescente de que a altura é um fator crucial para o sucesso tem feito com que os pais sul-coreanos apelem para tudo o que for possível para aumentarem a altura dos filhos, estimulando o surgimento de centenas de "clínicas de crescimento" que frequentemente oferecem injeções de hormônios, medicina oriental tradicional à base de ervas e exercícios especiais para fazer com os jovens clientes fiquem mais altos.

"Na nossa sociedade, a aparência é tudo", diz Seo, 35. "Temo que a minha filha seja mais baixa do que as suas colegas. Eu não quero que ela seja ridicularizada e que perca a auto-confiança por causa da sua altura".

Seo gasta US$ 770 (R$ 1.370) por mês com o tratamento de Moon Bo-in e do filho de quatro anos em uma dessas clínicas, a Hamsoa, que possui 50 filiais espalhadas pelo país. O tratamento fornecido pela clínica inclui a acupuntura, a aromaterapia e, duas vezes por dia, o uso de um tônico que contém chifre de veado, ginseng e outras ervas medicinais.

"Os pais prefeririam aumentar a altura dos filhos em dez centímetros do que deixar para eles uma herança de um bilhão de wons", diz o médico de Hamsoa, Shin Dong-gil. "Se você pensar em uma criança como sendo uma árvore, o que tentamos fazer aqui é fornecer a ela as condições corretas de solo, vento e luz para ajudá-la a crescer. Nós ajudamos as crianças a recuperar o apetite, dormir bem e manter a forma física de forma que possam crescer melhor".

Antigamente os coreanos valorizavam aquilo que era visto como a coragem inerente das pessoas mais baixas. Algo que se refletia no ditado, "Uma pimenta menor é mais ardida", e na admiração pelo ex-homem forte da Coreia do Sul e, no exterior, por Napoleão Bonaparte. Na Coreia do Norte, o temido e reverenciado líder Kim Jong-il tem apenas 1,65 m de altura (ou menos, já que ele acrescenta alguns centímetros com os sapatos de salto alto e o estilo de cabelo bizarro).

Mas sem dúvida ser baixo está fora de moda na Coreia do Sul, em parte devido à inundação na mídia de modelos ocidentais de beleza e sucesso. "Hoje em dia as crianças zombam se você mencionar Napoleão e Park Chung-hee", diz Park Ki-won, diretor da clínica de crescimento Seojung. "Na televisão, todos os ídolos jovens são altos. Como a nossa sociedade tem uma forte tendência a encaixar-se em grupos e em seguir a moda, ser baixo é um problema. As crianças baixas são isoladas pelos colegas".

Vitaminas promovidas como substâncias para aumentar a altura tornaram-se sucessos de venda no país, e os jornais e lojas próximos às escolas fazem propagandas de sapatos dotados de plataformas ocultas que fornecem a quem os usa alguns centímetros a mais de altura.

As preocupações quanto a esta tendência também estão aumentando, e alguns grupos advertem que as clínicas de crescimento, embora respeitem a lei, prometem muito mais do que as evidências concretas mostram ser possível.

Yoon Myoung, um pesquisador da Consumidores da Coreia, uma organização que, com o auxílio de cientistas, vem investigando a disseminação das clínicas e dos seus métodos de marketing, diz que os pais deveriam ser mais céticos.

"Não existe nenhuma prova clínica ou outras evidências de que esses tratamentos de fato funcionem", diz Yoon. "Eles usam propagandas exageradas e enganosas para atrair os pais. Mas as famílias coreanas têm com frequência apenas um filho e desejam fazer tudo o que puderem por esta criança".

Até mesmo algumas das clínicas manifestam preocupação quanto ao nível de expectativa dos pais. O médico Park Seung-man, o diretor da clínica de crescimento Highki, afirma: "Existe uma lacuna entre a altura que as crianças podem alcançar e a estatura que as mães desejam que elas atinjam".

No mês passado, o desconforto crescente com a nova tendência explodiu quando uma estudante universitária verbalizou os seus sentimentos em um programa de entrevistas na televisão.

"Ser alto significa ser competitivo", disse a chamada "rainha do campus", Lee Do-kyong, da Universidade Hongik, em Seul. "Eu acho que os baixinhos são uns derrotados".

Ela acrescentou: "O presidente Sarkozy, da França, é alvo frequente de zombarias por ser mais baixo do que a primeira-dama Carla Bruni. O fato de os homens baixos serem alvos de gozações é um fenômeno universal".

Depois da entrevista, blogueiros do país não pouparam críticas à moça, e parlamentares criticaram a estação, a KBS-TV, por não ter eliminado tais comentários durante o processo de edição. Alguns telespectadores entraram com processos judiciais por difamação. Lee foi obrigada a se desculpar, e a Comissão de Padrões de Comunicação da Coreia do Sul ordenou que a emissora repreendesse os produtores do programa por "violarem os direitos humanos" e "promoverem a ideia de que a aparência é tudo".

"Ela disse simplesmente o que todo mundo pensa, mas não ousa falar publicamente", diz o médico Kim Yang-soo, diretor da clínica de crescimento Kiness. "Aqui neste país, quem modifica a altura modifica também o seu destino".

Na clínica Kiness, Kim Se-hyun, uma estudante da quinta série, caminha em uma esteira ergométrica tendo o torso envolto por um apoio que está suspenso a uma barra de aço no teto. Segundo a clínica, esse aparelho esticará a coluna da garota e possibilitará que ela se exercite com menos pressão sobre as pernas.

Perto dali, o suor rola pelo corpo de Lee Dong-hyun, 13, enquanto ele pedala em uma bicicleta ergométrica, lendo ao mesmo tempo uma revista em quadrinho. Atrás dele, a sua irmã, Chae-won, que é a garota mais baixa na sua turma da primeira série, estica-se para alcançar os dedos dos pés sobre um colchonete azul de ioga, gritando quando um instrutor pressiona as costas dela para frente.

Há dois anos, a mãe deles, Yoon Ji-young, tentou algo mais radical. Ela fez com que Dong-hyun submetesse-se a injeções de hormônio de crescimento seis dias por semana, ao custo de US$ 850 (R$ 1.515) por mês.

Ela interrompeu o tratamento oito meses atrás, por temer efeitos colaterais. Agora ela leva os filhos de carro à clínica Kiness três vezes por semana e monitora os exercícios deles durante duas horas. "Tanto eu quanto o meu marido somos baixos", explica Yoon, 31, que tem cerca de 1,52 m de altura. "Não quero que os meus filhos me culpem quando forem adultos".

Chang Young-hee, 54, que tem 1,47 m de altura, aguarda o fim da sessão de exercícios do seu filho na Kiness. Ela diz que os seus filhos já foram alvo de discriminação por causa da altura. As duas filhas dela tem formação superior e bons empregos, mas quando chegaram à idade de casar, os pares potenciais consideraram as suas estaturas baixas um defeito (ambas acabaram encontrando parceiros e se casando).

"Senti como se tivesse sido golpeada na cabeça", diz Chang. "Eu aprendi uma lição. Se você ficar atrasado nos estudos, dá para recuperar depois. Mas quem perde a oportunidade de crescer, perde a chance para sempre".

Assim, há quatro anos ela leva o filho mais novo, Seo Dong-joon, à Kiness. O garoto, que atualmente tem 15 anos de idade, sabe quais são as suas metas.

"Se eu for alto, terei uma vantagem na hora de selecionar a minha futura mulher", explica ele, segurando um livro de vocabulário de língua inglesa, e estudando enquanto se exercita. "Caras baixos são vítimas de gozações na escola".

Independentemente dessa tendência, os sul-coreanos têm crescido, graças a mudanças na dieta. Segundo dados governamentais, nos últimos 30 anos a altura média dos alunos do último ano do segundo grau na Coreia do Sul aumentou em 8,9 centímetros, subindo para 1,73 m. A altura das meninas da mesma idade aumentou em 5,1 centímetros, chegando a uma média de 1,60 m.

Os médicos das clínicas de crescimento dizem que a maioria das crianças deseja apenas atingir a nova média de altura. No entanto, como há adolescentes mais altos, aqueles que não tem a mesma altura sentem-se ainda mais baixos. "A diferença de altura entre os mais altos e os mais baixos tornou-se mais pronunciada", diz Park Seojung, que recentemente inaugurou 36 clínicas de crescimento, em regime de joint-venture, na China, e que afirma que o desejo de ficar mais alto é comum em toda a região.

Se isso for verdade, um país que ficou para trás é a Coreia do Norte. Naquele país, os racionamentos de comida deixaram as crianças atrofiadas, segundo agências de ajuda humanitária da Organização das Nações Unidas (ONU) e privadas. Park citou o caso de um adolescente de 16 anos que fugiu da Coreia do Norte em julho deste ano para juntar-se à sua mãe, que havia chegado à Coreia do Sul três anos antes. O garoto tinha 1,52 m, sendo 10,3 centímetros mais baixo do que a média sul-coreana.

"A altura dele não era incomum para a Coreia do Norte", disse Park. "Mas quando a mãe dele o viu novamente, ela chorou porque o garoto não havia crescido nada e porque ela sabia das desvantagens que ele teria aqui".

"O meu sonho é abrir clínicas de crescimento na Coreia do Norte", diz Park. "Assim, quando nos unificarmos, as crianças dos dois lados não apresentarão diferenças de altura". 

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