Estudo

Formação em ‘profissões do futuro’ tem retorno salarial pior que carreira tradicional

Segundo os pesquisadores, os baixos retornos indicam que o Brasil ainda não está nesse estágio. Esses resultados colocam em questão que tipo de políticas públicas devem ser implementadas.

Formação em 'profissões do futuro' tem retorno salarial pior que carreira tradicional

O estudo aponta que o retorno salarial para quem se forma nessas áreas do conhecimento no Brasil é de 12,2%. — Foto:Reprodução/BritishCouncil

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – Brasileiros formados em áreas STEM -em particular as mulheres- têm dificuldade em progredir na carreira, para conseguir melhor remuneração em seu campo de formação no Brasil, aponta um estudo dos pesquisadores Cecilia Machado, Laísa Rachter, Fábio Schanaider e Mariana Stussi.

STEM é a sigla em inglês para as áreas de Ciência, Engenharia, Matemática e Computação, os chamados “empregos do futuro”. O investimento nesses campos de formação é considerado por especialistas como um passo essencial para que o país se destaque internacionalmente nos próximos anos.

O estudo aponta que o retorno salarial para quem se forma nessas áreas do conhecimento no Brasil é de 12,2%, mais modesto do que o retorno aos formados em áreas mais tradicionais, como medicina (75,5%) ou direito (36,6%).

Rachter explica que os dados contemplam pessoas entre 25 e 54 anos, com alguma formação superior. As conclusões, portanto, não consideram aqueles profissionais que, mesmo sem concluir a faculdade já começam a trabalhar na área de tecnologia.
Os pesquisadores, no entanto, reforçam que há uma heterogeneidade entre os salários de diferentes tipos de formação STEM. Engenheiros e arquitetos ganham, em média, retornos salariais 35% maiores que outras ocupações, enquanto a remuneração de pessoas com formação em computação e matemática são inferiores, de 4,8%.

Segundo os pesquisadores, os baixos retornos indicam que o Brasil ainda não está nesse estágio. Esses resultados colocam em questão que tipo de políticas públicas devem ser implementadas para aumentar o retorno sobre ocupações STEM em algumas áreas específicas.

No caso da formação em computação e matemática, embora os profissionais de computação costumem ser disputados e ter alta remuneração, as outras profissões deste subgrupo acabam puxando para baixo a remuneração, explica Rachter.
“Alguém que se forma em matemática, por exemplo, costuma ter duas trajetórias de carreira distintas: pode trabalhar em matemática aplicada, programação, trabalhar em fintechs e ciências de dados ou pode ir para o magistério, em que o salário é muito menor”, diz.

“As mulheres com essa formação têm maior probabilidade de atuar em educação e saúde, o que contribui para uma remuneração menor delas”, acrescenta Rachter.
No entanto, o campo de graduação de computação e matemática deve desempenhar um papel crucial na revolução da automação e da inteligência artificial em economias avançadas.

“O mercado de trabalho é muito dinâmico e responde rapidamente aos ciclos econômicos, as empresas se adaptam aos novos tempos, mas acaba levando mais tempo para que a formação dos profissionais se adapte”, diz Cecilia Machado, economista-chefe do Banco BOCOM BBM e professora da EPGE – FGV (Escola Brasileira de Economia e Finanças, da Fundação Getulio Vargas).

O estudo também acompanhou, a partir de dados do Censo de 2010, até que ponto a formação nessas áreas tecnológicas garante que o diplomado consiga um emprego nelas e o resultado foi decepcionante.

A maior parte dos homens formados nas áreas STEM acabou trabalhando em empregos que não estão relacionados à formação e só um terço deles (33%) atuava nos chamados “empregos do futuro”.

Entre as profissionais mulheres, essa participação é ainda menor: apenas 20% das formadas nessas áreas trabalhavam em profissões relacionadas.

Os pesquisadores observam que o sucesso do diplomado no mercado de trabalho também é resultado de várias decisões ao longo da carreira. Mas dado o número de pessoas com formações STEM que não necessariamente vão trabalhar nesse campo, realidade que também é pior entre as mulheres, parece haver um desperdício de formação nessas áreas.

“Um dos grandes desafios para atrair mulheres é romper os preconceitos de gênero, de que mulher não gosta de matemática, por exemplo. A menor participação delas acaba sendo reforçada por vícios culturais”, lembra Machado.

Da mesma forma, o percentual de homens sem formação nessas áreas e que mesmo assim atuam em empregos tipo STEM é maior do que o das mulheres na mesma condição -de 6% para eles, ante 2% para elas.

Segundo Machado, isso também pode ser um reflexo de questões de gênero. “Os homens tendem a ser mais estimulados a desenvolver habilidades de uso de tecnologias e de matemática, considerando-se os investimentos que são feitos neles ao longo da vida.”

Na comparação internacional, os pesquisadores lembram que o setor de tecnologia no Brasil é menor tanto em quantidade de pessoas atuando, em termos absolutos, quanto em termos relativos, na proporção desses profissionais na força de trabalho.

A presença desses profissionais é inferior na comparação com países como Estados Unidos e Canadá. No terceiro trimestre do ano passado, o número de trabalhadores em funções STEM era de 1,5 milhão, ou 2% dos empregos, segundo outro estudo publicado pelos quatro pesquisadores. Enquanto isso, na economia norte-americana, 10 milhões (7%) ocupam essas funções.

“O potencial de crescimento no Brasil e no mundo é grande, essas parecem ser realmente profissões do futuro com melhores perspectivas salariais, mas na parte tecnológica, não estamos tão à frente quanto os países desenvolvidos. E quanto mais trabalhadores STEM um país tem, mais ele consegue absorvê-los na força de trabalho”, diz Machado.

“Lá fora, sem dúvida, há uma preocupação muito grande nesse sentido. O MIT [Instituto de Tecnologia de Massachusetts, na sigla, em inglês] tem uma força-tarefa para olhar o mercado de trabalho em países desenvolvidos e tenta inferir como será a cara do emprego no futuro”, diz o pesquisador do FGV Ibre Fernando Veloso.

Ele ressalta que, como o mercado de trabalho muda muito rapidamente, o Brasil precisa apostar em um sistema de formação que seja mais flexível e que olhe para as oportunidades de emprego que estão surgindo. “Não basta que o Brasil tenha uma preocupação em formar muitas pessoas, é preciso que o governo se preocupe se elas vão ter emprego, bom salário e proteção social.”

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