Economia

Incerteza política afasta investidor, diz presidente do Banrisul

"Mudanças bruscas não favorecem a confiança do investidor e essa é a base do funcionamento da economia", explicou.

Incerteza política afasta investidor, diz presidente do Banrisul

o presidente do Banrisul, Claudio Coutinho — Foto:Reprodução

SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) — As incertezas no cenário político e econômico brasileiro podem diminuir a confiança do investidor e afastar o capital estrangeiro do país, afirmou o presidente do Banrisul, Claudio Coutinho.

O movimento, segundo ele, passa pelo questionamento da política liberal do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e pela anulação, cinco anos depois, das condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo ministro Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal).

“Não dá para uma hora ter uma política liberal em relação aos preços de combustíveis e depois não ter mais, por exemplo. Mudanças bruscas não favorecem a confiança do investidor e essa é a base do funcionamento da economia. Uma coisa é risco, outra coisa é incerteza”, afirmou à Folha, dizendo que o lento ritmo dos programas de vacinação também tem impacto na recuperação do país.

Para o executivo, apesar de as discussões sobre a privatização do Banrisul já terem sido abafadas pelo governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), o tema ainda deveria ser ponderado, considerando as dificuldades que o banco enfrenta na gestão por ser público.

“O Banrisul tem se saído muito bem em termos de retorno, mas a competição a longo prazo é muito grande e bancos estatais, que têm diversas amarras legais, terão cada vez mais dificuldade”, afirmou.

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Pergunta – Como foi o ano de 2020 para o Banrisul?
Claudio Coutinho – Logo no início da pandemia, entre março e abril, tomamos diversas medidas para prevenir grandes impactos da crise, reforçando os canais digitais e migrando algumas operações para o teleatendimento.
Por outro lado, também nos preocupamos com a saúde financeira do banco. Repactuamos R$ 744 milhões em dívidas, no total, com prazos de três ou seis esses. Até agora, as operações repactuadas já estão há algum tempo em fase de pagamento e a inadimplência da carteira está muito baixa. Em dezembro a inadimplência estava em 2,59% e nós já tínhamos recebido R$ 273 milhões.
Já do ponto de vista econômico, o primeiro, o segundo e o terceiro trimestres bem contaminados pela pandemia e foi só no segundo semestre que começamos a reativar nossos planos e a retomar níveis maiores. O crédito cresceu 3,9% no ano, sendo um avanço de 7% só no último trimestre, por exemplo.

Qual é a expectativa para 2021?
CC – Estávamos muito otimistas na entrada deste ano, mas infelizmente estamos nos frustrando e ficando cada vez mais preocupados.
Em setembro e outubro de 2020, nós olhávamos para frente e achávamos que em janeiro ou fevereiro já estaríamos em uma fase acelerada de vacinação. Agora, estamos em março e muito longe desse ritmo estar acelerado.
É inacreditável o quão lento está sendo o ritmo que estamos vivendo e isso está contaminando seriamente a economia. Sem falar no drama humano que está por trás dessa doença.

Como isso impacta na confiança dos investidores?
CC – Os investidores querem o cenário mais calmo e confortável possível, no qual você consiga enxergar e ouvir o que está acontecendo sem nebulosidade.
Ninguém gosta de ambientes agitados ou barulhentos demais e a surpresa, para o investidor, é algo desfavorável porque gera incerteza.
Não dá para uma hora ter uma política liberal em relação aos preços de combustíveis e depois não ter mais, por exemplo. Mudanças bruscas não favorecem a confiança do investidor e essa é a base do funcionamento da economia.
Uma coisa é risco, outra coisa é incerteza.

A anulação das condenações do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua possível disputa à presidência em 2022 também são incertezas para o investidor?
CC – O que mais afetou a economia nos últimos tempos não foi a questão se o ex-presidente Lula é candidato [à presidência em 2022] ou não. O Lula foi presidente duas vezes e a economia andou bem, não há recall negativo dos investidores. A questão é voltada para a incerteza.
Causou muito mais espanto o mesmo juiz ter outra decisão em cima do mesmo projeto judicial depois de cinco anos. Foram vários eventos, diversas apelações em cima do mesmo tema.
Essa incerteza sobre como a justiça vai reagir em determinadas questões é preocupante. Não me preocupa quem será o presidente do Brasil ou do clube do futebol que eu gosto. O que me preocupa é se há estabilidade institucional no Brasil para quem investe no país.
É a imprevisibilidade que é o problema, não o Lula.

Como você enxerga a atual situação financeira do Rio Grande do Sul?
CC – O governo estadual tem uma fragilidade financeira mas, desde o início desse ano colocou a folha [de pagamentos] em dia.
Foi um trabalho importante da equipe do Eduardo Leite [governador gaúcho], mediante diversas reformas que foram feitas e possibilitaram uma gestão mais eficiente do fluxo de caixa do Estado.
Dito isso, também é importante ressaltar que o governo do Rio Grande do Sul tem 40% da economia calcada no agronegócio, e quem está no agronegócio está no paraíso na terra.
O Brasil, como é um país exportador muito forte de commodities, principalmente as agrícolas, acaba se beneficiando. Esse setor é ultracompetente em termos de tecnologia, infraestrutura e armazenagem.
Então temos um olhar bastante positivo para o Rio Grande do Sul. Alguns segmentos, pela força da pandemia, não estão funcionando bem, como o turismo e os setores de serviço, como bares, restaurantes e cultura. Mas o Estado tem a economia privada pujante, assim como a indústria mecânica na serra gaúcha.
No geral, estamos animados para a economia gaúcha e preparados para financiar tanto a indústria quanto o agronegócio.

Recentemente, o governador Eduardo Leite (PSDB) afirmou que manterá o Banrisul como banco público. Qual a sua opinião sobre a privatização da instituição?
CC – A privatização do Banrisul depende da decisão do governo, que é acionista majoritário do banco. E não só dele, mas da assembleia legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, também, porque a constituição do Estado manda que é preciso fazer um plebiscito para o povo gaúcho decidir se pode ou não privatizar.
O Banrisul tem se saído muito bem em termos de retorno, mas a competição a longo prazo é muito grande e bancos estatais, que têm diversas amarras legais, terão cada vez mais dificuldade nisso e acho que a assembleia deveria meditar sobre o tema.
Os analistas já dizem que os grandes bancos privados não conseguem competir com fintechs em diversos aspectos e isso é agravado quando colocado em relação a um banco público. São diversas limitações e salvaguardas que o banco público tem que ter mas que, de certa forma, dificultam a gestão, tornando-a mais lenta.

O banco deve retomar o IPO (abertura de capital) do Banrisul Cartões?
CC – A então administração do banco desistiu do IPO da área de cartões em novembro de 2018 e não fizeram a transação.
Agora, o que fizemos recentemente foi contratar o JPMorgan no início de 2020 para dar assessoria sobre o tema. O mercado de maquininhas e adquirência está muito quente e disputado, com diversos entrantes e uma grande guerra de preços e share [participação].
Assim, nos preocupamos de não estar olhando quais os nossos riscos e qual rumo deveríamos tomar em relação às nossas opções estratégicas. A assessoria do JP continua e vigor até agora, mas ainda não tomamos nenhuma decisão em relação a abrir capital ou não. Além disso, de certa forma, a pandemia também diminuiu o nosso tempo disponível para o tema, que ficou meio renegado.
Vamos voltar a acompanhar mais de perto, mas ainda não tem nada definido.

Quais as apostas do banco para 2021?
CC – Temos um grande foco no agronegócio, além de uma meta de crescimento de crescer entre 10% e 15% no crédito para pessoas físicas, especialmente em consignado.
Continuamos com uma grande aposta na digitalização dos nossos processos e ampliar o leque do que é possível fazer pelo aplicativo.
Também dedicamos bastante foco para a linha de sustentabilidade da nossa carteira, na qual financiamos placas solares para a geração de energia. O tema é de tamanha importância que, além disso, decidimos criar uma gerência de sustentabilidade no ano passado, com o objetivo de zerar a nossa pegada de carbono e eliminar qualquer energia que não fosse limpo.
Não temos um prazo para concluir essa meta ainda, mas é algo que trabalharemos muito forte ao longo deste ano.

Há alguma previsão de aumento das reservas contra calotes ou da inadimplência?
CC – No ano passado já fizemos uma provisão importante para fazer frente a uma inadimplência que, aliás, não veio. Estamos bem tranquilos, inclusive porque o estado também, aos poucos, tem melhorado sua situação financeira.
Podemos voltar a medida de renegociação de dívidas, mas tudo depende da situação econômica. Estamos atentos e monitorando a inadimplência mas, até agora, não houve nenhuma mudança.
Se percebermos que essa medida será necessária, realmente retomaremos esse plano.
Até o momento, nós não esperamos que haja um repique de inadimplência mas, até aí, também não esperávamos uma segunda onda [do coronavírus] tão grande e negativa.
Uma coisa é absorver a primeira grande onda e seguir em frente, outra é encarar uma segunda onda ainda maior. Caso sigamos por esse caminho, acho que realmente algum tipo de medida deverá ser tomada pelo governo, talvez uma segunda versão do Pronampe [Programa Nacional de Apoio às Microempresas e Empresas de Pequeno Porte].

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