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O ‘lugar mais estéril do planeta’, onde cientistas buscam misteriosa matéria escura

Mais de um quilômetro abaixo da terra, uma equipe de mais de 250 pesquisadores está tentando detectar uma partícula que seria a chave para explicar do que é feito 25% do Universo.

O 'lugar mais estéril do planeta', onde cientistas buscam misteriosa matéria escura

O que é matéria escura? A resposta é simples: ninguém sabe. É um dos maiores enigmas da Ciência.

Os cientistas passaram décadas procurando pistas sobre esse misterioso componente, do que é feito 25% do Universo.

Mas como você procura algo que você nem sabe o que é? Como encontrar algo que é invisível?

E se é tão difícil de encontrá-la, por que embarcar em uma missão tão complicada?

Estas questões foram a inspiração para uma equipe de mais de 250 pesquisadores de vários países, que publicou recentemente os primeiros resultados de um ambicioso projeto com o qual esperam finalmente encontrar sinais da matéria escura.

Trata-se do LUX-ZEPLIN (LZ), um sofisticado laboratório localizado a 1,5km de profundidade em uma mina de ouro abandonada na cidade de Lead, na Dakota do Sul, Estados Unidos.

Ele é subterrâneo com o intuito de isolar a maior quantidade de radiação e poeira que poderiam gerar contaminação e dificultar a busca pela matéria escura.

Este é o mapa mais detalhado da distribuição da matéria escura no universo. As áreas brilhantes representam os pontos de maior concentração, que é onde as galáxias se formam. — Foto: N JEFFREY/OBSERVATORIO DE LA ENERGÍA OSCURA

De acordo com seus criadores, o LZ é o detector de matéria escura mais sensível já construído. Para fazer isso, eles dizem que conseguiram tornar o interior da LZ “o lugar mais estéril da Terra”.

“O centro do detector é como a mente de um monge budista”, disse Chamkaur Ghag, pesquisador da LZ e professor do Departamento de Física e Astronomia da University College London, no Reino Unido, à BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC).

O detector foi projetado para captar um sinal, mesmo extremamente fraco, do que poderia ser uma partícula de matéria escura. É como “ouvir com atenção no meio de um campo silencioso”, dizem os criadores do LZ em seu site.

Como funciona o LZ? Como ele pesquisa a matéria escura?

A enigmática matéria escura

Atualmente, sabemos apenas do que é feito 5% do Universo. Esses 5% correspondem à matéria comum, que podemos ver ou tocar.

As partículas que compõem essa matéria comum são descritas no que é conhecido como Modelo Padrão.

Os 95% restantes de matéria são um mistério.

Ninguém viu a matéria escura, mas seus efeitos estão sendo sentidos no cosmos — Foto: GETTY

Físicos e astrônomos suspeitam que, dessa porcentagem, 70% é energia escura e 25% é matéria escura. A energia escura é um tipo de força repulsiva que acelera a expansão do Universo.

Por sua vez, a matéria escura é um “algo” invisível que age como um ímã que mantém as galáxias unidas.

Observações astronômicas mostraram que as galáxias giram muito mais rápido do que seria esperado com base em sua massa visível.

Os cálculos indicam que a gravidade correspondente a essa massa não é suficiente para manter as galáxias juntas, então deve haver “algo” que adicione massa e, portanto, gravidade extra e evite que sejam disparadas pelo espaço.

Esse “algo” que explica a gravidade extra é a matéria escura.

É chamada de escura porque não emite, reflete ou absorve luz, tornando-a muito difícil de ser observada.

Por isso, até agora, o único sinal que os cientistas têm de sua existência é o efeito gravitacional que a matéria escura exerce sobre a matéria comum, da qual são feitas estrelas e galáxias, por exemplo.

O laboratório LZ é projetado para detectar matéria escura — Foto: LZ SURF

Portanto, não sabemos o que é a matéria escura, mas, sem ela, o Universo seria muito diferente de como o conhecemos.

E do que é feita a matéria escura?

Várias ideias foram formuladas por décadas para explicar do que é feita a matéria escura, mas ainda não há uma resposta convincente.

Uma possibilidade é que seja feita de “partículas supersimétricas”, que são partículas hipotéticas que formam pares com aquelas que compõem a matéria comum.

E há outro candidato para explicar do que é feita a matéria escura. O WIMP (Partícula Massiva de Interação Fraca), uma partícula hipotética que o LZ espera detectar.

Segundo a Nasa, a agência especial americana, os WIMPs são os principais candidatos a explicar a matéria escura.

Acredita-se que os WIMPs tenham se formado naturalmente após o Big Bang, e deve haver tantos deles que poderiam ser uma explicação para a matéria escura.

Esses WIMPs teriam a capacidade de permear o Universo e até mesmo passar pela matéria comum, mas, em raras ocasiões, um deles poderia colidir com o núcleo de um átomo. E o LZ está à procura desse momento preciso.

Jogo de sinuca

O LZ é um tanque feito de titânio, preenchido com 10 toneladas de xenônio líquido ultrapuro.

Os pesquisadores escolhem o xenônio porque, sendo um gás nobre, pode ser levado a níveis muito altos de purificação, para que a maioria dos contaminantes possa ser removida.

O experimento consiste em observar as partículas que percorrem o cosmos até chegarem ao centro do tanque.

Com sorte, uma dessas partículas colide com o núcleo de um dos átomos de xenônio, como duas bolas de bilhar.

Quando esse choque ocorre, uma explosão de luz é gerada e detectada pelos sensores do LZ.

Assim, após uma colisão, a tarefa é analisar as características da luz que foi gerada e, com base na análise, deduzir que tipo de partícula colidiu com o átomo de xenônio.

O LZ está equipado com sensores de luz para detectar colisões de partículas — Foto: LZ SURF

Com a paciência de um monge budista, os pesquisadores do LZ esperam que, em algum momento, seja um WIMP que atinja o tanque e colida com o núcleo de um átomo de xenônio.

O LZ começou a operar em abril e, em seus primeiros resultados publicados no início de julho, ainda não foram detectados vestígios de matéria escura.

‘O lugar mais estéril do planeta’

Um dos grandes desafios do LZ é evitar a entrada de partículas indesejadas no tanque – que contaminam, confundem ou impedem a visualização de um WIMP que chega repentinamente.

O objetivo é esterilizar todo o cenário para quando o WIMP – se existir – decidir aparecer.

Portanto, é fundamental que a LZ seja subterrânea.

Raios cósmicos bombardeiam constantemente a atmosfera do planeta, criando partículas que podem atingir um detector como o LZ e gerar sinais indesejados.

Dois investigadores da LZ inspecionando possíveis partículas de poeira no tanque de xenônio — Foto: LZ SURF

Como ele está a 1,5km abaixo do solo, evita-se a chegada de um grande número dessas partículas. Alguns podem chegar ao tanque, mas as chances são muito menores.

Por que procurar a matéria escura?

“Encontrar a matéria escura nos ajudaria a resolver o problema da massa que está faltando”, diz Ghag. “Isso equivale a entender do que 25% do Universo é feito.”

Ghag também menciona que “entender ou descobrir a matéria escura seria a primeira janela para ver além do Modelo Padrão, que atualmente é uma sala fechada”.

O Modelo Padrão é de longe a melhor explicação das partículas e forças que compõem toda a matéria comum. Este modelo, no entanto, apenas explica do que é feito cerca de 5% do Universo.

Outra questão que surge é se, ao detectar a matéria escura, ela poderia ser usada como fonte de energia.

Pesquisadores tentam detectar partícula que seria chave para explicar do que é feito 25% do Universo — Foto: LZ SURF

A este respeito, os criadores da LZ sustentam que “é improvável que consigamos aproveitar o poder da matéria escura nos próximos séculos”.

“Não está claro que benefícios as gerações futuras podem obter ao aproveitar a matéria escura, embora essas coisas tendam a ser notavelmente imprevisíveis.”

Mas, além da missão principal do LZ, o laboratório em si é um avanço para a Ciência.

Suas técnicas de análise de raios e sensores podem levar a inovações na indústria farmacêutica de alimentos, e seus algoritmos de sistema podem ser utilizados em áreas como a medicina nuclear.

“Mas talvez o maior benefício para a humanidade seja o próprio conhecimento”, dizem os criadores do LZ.

“Somos uma espécie curiosa, parece que estamos programados para querer saber como funciona o mundo ao nosso redor.”

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